quinta-feira, 11 de outubro de 2012

O império dos sentidos de Lucrecia Martel



O vigor criativo de Lucrecia Martel é apontado como um dos mais representativos do novo cinema argentino. Seu trabalho chamou a atenção de nomes como Pedro Almodóvar, que produziu os seus últimos longas-metragens: A mulher sem cabeça e A menina santa. O seu estilo é bem peculiar, o enredo pouco importa para o desenrolar da trama, sendo a sensação dos sentidos o fator decisivo que Martel busca para transmitir as mensagens das suas películas. É como cita Gabriela Halac em seu artigo Poética Pura, que faz parte do livro Poéticas en el cine argentino:
Em seus filmes não há um aspecto particular de uma realidade social (violência, abandono, desemprego, falta de comunicação, etc). Não escolhe um tema. Mas processa bem um caleidoscópio de imagens variadas. Seus focos são distorcidos. Detém-se nos detalhes que esta subjetividade significa. Arma novas figuras permanentemente. Constrói assim uma poética absolutamente pessoal, um realismo subjetivo cujos os sentidos se multiplicam.

Desde seu primeiro longa-metragem, O pântano, Martel segue uma linha bem particular que dita um ritmo por vezes arrastado. Neste filme ela mostra a história de uma família de classe média alta na Argentina no cenário da crise econômica por que passou a Argentina. Este, aliás, é um dos pontos de convergência do novo cinema argentino. Só que diferente de Pablo Trapero, em que este realismo se dá em outro nível. Como ocorre na primeira cena do filme, onde a matriarca da família sofre um acidente onde se corta com o vidro de um copo na beira da piscina. Lá estão várias pessoas, inclusive seu marido, que não se movem para ajudá-la. Esta metáfora da imobilidade do argentino ocorre em um nível quase metafísico. Com o recurso que virou uma das suas marcas registradas, o close que quase sempre corta as pessoas, ela transmite o marasmo dessas pessoas, que estão imóveis feito estátuas vendo tudo passar. A atmosfera é tão particular que você não vê uma tentativa de algum tipo de julgamento moral, e sim a busca pelo sentimento que elas estão emanando.

Para estimular os sentidos, ela utiliza o som de uma maneira a tocar o público. Com ela diz na entrevista para o site do jornal portenho El clarín sobre como estava decepcionada com algumas salas de cinema que não possuíam o  balanço de som necessário para dá ao espectador o sentimento esperado. “A equipe teve muito trabalho com em som do filme para que a pessoa que paga a entrada tenha uma versão incompleta. Pena que eles a viram em uma sala inadequada”. Diferente da tradição do cinema americano clássico que usa o som de maneira a interferir a todo instante no que as pessoas sentem, ela usa este recurso narrativo de maneira pausada, que é usado somente em partes chaves. Uma curiosidade é que muitas vezes o som aparece de maneiras espontâneas, como alguém dentro do carro (na hora que a protagonista de A mulher sem cabeça liga o som do carro) que coloca alguma música ou o próprio som ambiente do espaço, como na festa de carnaval em O pântano.

Criando escola

A forma de filmar de Martel tem começado a ser um ponto de referência para novos realizadores, como Albertina Carri. A diretora argentina segue em muitos pontos o estilo de Martel. O filme que mais representa influência é La Rabia de 2008, seu último longa-metragem. Elementos como tensões sexuais subterrâneas, a expressão por meio de desenhos por uma incapacidade de fala de um dos personagens e uma história que não precisa ser entendida e sim sentida são visíveis na película. É como observa José Geraldo Couto, crítico da Folha de São Paulo, “A diretora Albertina Carri descreve esse mundo macho um pouco à maneira de sua compatriota Martel, meio de lado, captando a ação já iniciada e abandonando-a antes de concluída. Um olhar oblíquo, lacunar”. Este filme possui a peculiaridade de ser produzido por outro importante nome do cinema argentino, Pablo Trapero.

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