A
tecnologia 3D no cinema ainda é uma técnica cara, o que significa risco zero
para os produtores cada vez mais caretas de Hollywood. Sendo assim temos filmes
que tem um visual espetacular, mas histórias sem consistência. O caso clássico
é Avatar, a maior bilheteria de todos os tempos no fundo é uma mistura de
Pocahontas com seres de outro planeta com tecnologia inferior que a nossa. Mas
as possibilidades do 3D são tantas que diretores de respeito tem começado a se
aventurar nela com desenvoltura, por exemplo, Martin Scorsese com Hugo
Cabret e Wim Wenders com Pina. O filme em questão desta crítica foi
feito por outro mestre do cinema, Werner Herzog. Que com A caverna dos
sonhos esquecidos faz seu debut nesta tecnologia.
O
alemão decidiu utilizar a técnica ao conseguir do ministro francês rara permissão
para registrar o interior da Caverna Chauvet, que foi descoberta por acaso na
França em 1994 por três espeleólogos em busca de cavernas na região. Ela foi
soterrada há cerca de 20 mil anos. O que manteve intacto o universo de homens
da caverna que começaram a usá-la como espaço de pintura há cerca de 32 mil
anos, sendo as mais antigas já encontradas. A qualidade das pinturas é algo
extraordinário, como se naquele espaço estivesse sendo criado o espírito do
homem moderno.
A
escolha de Herzog foi acertada, como a maior parte da parede é inclinada, temos
a profundidade exata das pinturas. É incrível como somos levados para o
interior do espaço com um realismo que nos deixa em transe, é como se de fato
estivéssemos lá dentro. A força das imagens e a narração em off do diretor nos
dão uma noção exata do tanto que o local é especial. Pois segundo especialistas
não era usada como casa e sim como um tipo de templo. Onde as pessoas se
reuniam no escuro para ver as pinturas, que com o jogo de luz das fogueiras,
dava uma sensação de movimento das figuras, o que Herzog define como um
proto-cinema. São estes tipos de comentários que dão força ao documentário, há
todo instante somos apresentados a teorias (às vezes malucas) do que motivava
estes primeiros homo-sapiens a pintar as paredes da caverna. Assim somos
levados à profunda erudição do diretor, que fez tantos clássicos da 7ª arte, Aguirre,
a cólera dos deuses, Fitzcarraldo e O enigma de Kaspar Hauser, só para
citar alguns deles.
Vendo
este direcionamento dado ao 3D me dei conta do tanto que esta tecnologia pode
ser usada para outras áreas que não o cinema. A educação iria ser revolucionada
com a sua aplicação, fico imaginando uma
aula de história com as ruínas do Egito e da Grécia antiga, em vez dos chatos
slides e fotos de livros, os alunos teriam sua atenção captada pela maravilha
que é o mundo em 3D. Talvez um dia esta energia possa ser redirecionada para
esta área.
No
término da sessão senti algo que há muito não sentia no cinema, uma conexão com
a pequenez da nossa noção de tempo. Os 5 mil anos que a caverna foi sendo
continuamente pintada são inimagináveis para nossa percepção moderna do tempo,
onde as coisas passam tão rápidas que um tempo histórico como a Revolução
Francesa, que ocorreu há “apenas” 224 anos, parece uma eternidade para nós.
Isso é o grande cinema, aquele que te faz imaginar e refletir sobre o que é
nossa passagem tão curta por este planeta. E Herzog, com sua maestria típica de
cineasta contestador, nos leva a essa reflexão com louvor. Vale ir ao cinema
ver A caverna dos sonhos esquecidos, pois é um grande acontecimento da
7ª arte de nosso tempo. A união perfeita entre o espetáculo e a reflexão,
infelizmente muito pouco usada no cinema atual.
Nenhum comentário:
Postar um comentário